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sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Acidentes aeronáuticos: Preveni-los, investigá-los ou mitigar-lhes as consequências? Leia mais (Read More): Acidentes aeronáuticos: Preveni-los, investigá-los ou mitigar-lhes as consequências?


As perdas materiais podem ser reparadas; as humanas não serão, jamais

A quem cabe a responsabilidade de controlar qualquer atividade aeronáutica, assoma a conveniência de promover correspondente prevenção de acidentes. Se por mais nada, pelo menos por economia patrimonial! Àqueles que operam aeronaves civis, a necessidade se completa, ademais, pela obrigação de preservar a integridade física de seus tripulantes e passageiros. A prevenção do acidente aeronáutico consiste, exclusivamente, em afastar da operação aeronáutica todas aquelas possibilidades de, a qualquer momento, uma eventualidade ultrapassar os limites físicos de determinada peça, ou os limites técnicos, operacionais ou fisiológicos da tripulação. Parece adivinhação.
Santos=Dumont voou duas vezes com o 14bis. Na primeira não tinha controle de inclinação, só tinha de arfagem e de direção. Pensou, o Genial Brasileiro, e introduziu o “aileron”. Preveniu a possibilidade de perda de controle lateral! A mesma coisa há de ter acontecido com todos os aviões feitos desde então.
Algumas destas possibilidades – que atingiram aeronaves ao longo dos tempos – são da história da Aviação: O formato das janelas dos Comet; a desintegração dos Electra; a instabilidade longitudinal dos P-47; o parafuso chato dos Zarapas (T-23), que custou a vida de José Mariotto Ferreira, piloto de provas da EMBRAER; as falhas das hélices dos T-6, só conhecidas quando João Jorge Bertoldo Glazer, trouxe um destes até o pouso forçado apesar do sofrimento físico e das imensas vibrações que sofria e agüentava; a inversão dos comandos em altas velocidades de todos os aviões de combate na II Guerra Mundial, a hélice escrava do Bandeirante e, mais recentemente, a prevalência dos comandos informatizados sobre a competência dos pilotos nas aeronaves de determinado fabricante ativo. Cada uma destas ocorrências – bem assim todas as outras que ocorreram com todos os outros modelos não mencionados aqui – precisam ser resolvidas sob pena de a operação daquela aeronave se tornar impossível.
Em 76, ainda sob a vigência do Decreto 70.050/72, o comandante do IV COMAR, Clóvis Pavan, identificou uma tendência indesejada em certa companhia especializada em aviação agrícola; mandou reunir os pilotos remanescentes e, ao preço de uma refeição para cada um dos dez pilotos, mandou mostrar-lhes o que acontecia. Resolveu – com um telefonema! – uma dificuldade que tinham. Fez Prevenção de acidente, de modo intuitivo, mas fez!
É ai que entra a investigação dos acidentes aeronáuticos. Frequentemente é possível saber quais dos limites foi ultrapassado. Na presença de sobrevivente ou de testemunha ocular conhecedora dos aspectos do voo, é sempre fácil! Às vezes, na ausência de sobreviventes, fica muito difícil! Lembra… Há três tipos de limites: os humanos, os materiais e os operacionais. Os limites humanos são duas condições; o limite material é uma falha e os treze limites operacionais são erros. Com freqüência quase absoluta, combinam-se entre si. Nos quarenta e sete anos que convivo de perto com investigação de acidentes aeronáuticos, só vi dois acidentes que só podem ser atribuídos a um único fator, um deles aqui no Brasil.
A investigação começa com a pergunta “o quê?” seguida de tantos “por quês?” quantos forem necessários. As respostas, apoiadas nos exames técnicos disponíveis – se necessários – conduzirá à identificação dos fatores que levaram à nefasta ocorrência. Cabe notar (1) que a presença de sobreviventes facilita extremamente os trabalhos de investigação; se os sobreviventes forem tripulantes técnicos, então, muito mais, ainda; (2) a presença de qualquer destroço é quase que indispensável; (3) as transmissões (automáticas ou não) sempre facilitam os trabalhos de investigação; e (4) os dados das “caixas-pretas” servem tanto para indicar a seqüência dos eventos como para confirmar os achados. – Engenharia reversa é como chamam atualmente.
O sistema em atual aplicação no Brasil, entretanto criou um novo objetivo: a mitigação das consequências em proveito dos envolvidos – irregularmente também envolvidos na prevenção e na investigação dos eventos. A cadeia de apreciação intermediária que se permite na fase de investigação dos acidentes induz ou permite a alteração dos achados, para conforma-los com os interesses de diversas naturezas existentes no trajeto.
Um exemplo: O organismo investigador da colisão Legacy x Boeing 737 exibiu-me particularmente (em 23 de janeiro de 2009) a restauração do voo do Boeing feita a partir do registrador de dados de voo. Após a colisão em voo, o painel da asa esquerda ainda aparecia flutuando, como se arrancado pelo “winglet” do Legacy. Impossível! O registrador está na cauda da aeronave e a asa cortada não podia induzir dados nele! Fraude! Alguns meses depois, tanto na própria sede do CENIPA como no ITA, o mesmo filme foi exibido sem o painel. Fraude confirmada!
A investigação de acidente aeronáutico é a segunda das mais nobres missões atribuída a alguém; a prevenção é a primeira; a mitigação das consequências – inclusive quanto às responsabilidades de terceiros – é o outro prato da balança a desmerecer-lhes o valor!
*Gustavo Adolfo Franco Ferreira é tenente-coronel aviador reformado da FAB. É especialista em Segurança de Voo.

fonte: http://www.aereo.jor.br/2012/10/19/acidentes-aeronauticos-preveni-los-investiga-los-ou-mitigar-lhes-as-consequencias/

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